terça-feira, 29 de março de 2016

Cólicas do Bebê


A cólica do bebê é representada na prática pelo choro súbito, inexplicado e inconsolável, que não responde às medidas habituais de conforto. Trata-se de um choro forte, agudo, estridente, aumentando de intensidade. A criança fica vermelha, se estica, vira a cabeça para os lados, as mãos ficam crispadas, as coxas fletidas sobre o abdome; frequentemente ocorre eliminação de gases, o que parece dar um alívio temporário. Este choro pode se prolongar por horas e é inconsolável, o que traz aos pais, sentimentos de frustração, impotência, ansiedade e sofrimento.
O diagnóstico da cólica é clínico, frequentemente de exclusão, que não se apoia em nenhum dadi de exame físico, nem laboratorial. Estes critérios clínicos são baseados na regra dos 3 de Wessel: duram pelo menos 3 oras, ocorrem pelo menos 3 dias por semana e pelo menos 3 semanas seguidas. Desaparecem aos 3 meses de vida. Acresce o curioso fato do choro com “hora certa”, isto é, as cólicas ocorrem num horário predeterminado, geralmente no fim da tarde, início da noite (19-23 horas).
A causa da cólica do lactente, que já é conhecida pelos pediatras há mais de um século, continua a representar um enigma. Diferentes causas que podem ser aditivas, mas frequentemente são contraditórias, têm sido aventadas, e estas podem ser divididas em gastrintestinais e não gastrintestinais.
A cólica pode ser uma variante normal e estaria relacionada a uma imaturidade fisiológica. É curioso notar que os prematuros têm o mesmo padrão de choro e de cólicas, e que atingem o pico com 6 semanas de idade gestacional, isto é, a mesma dos lactentes a termo.
Temperamento da criança, ansiedade dos pais (que pode ser agravada por inexperiência e falta de apoio), depressão materna, personalidade da mãe, problemas na dinâmica familiar e a possibilidade de sequelas emocionais são aspectos que já foram levantados e apaixonadamente debatidos.
Na esfera gastrintestinal foram levantadas algumas hipóteses cujas respectivas pesquisas não foram conclusivas:
Motilidade intestinal alterada – hiperperistaltismo colônico e pressão retal aumentada. Fala a favor dessa hipótese, a ação efetiva de alguns antiespasmódicos cujos efeitos colaterais, às vezes graves, impedem seu uso terapêutico.
Hormônios intestinais – a motilina, que exagera a peristalse intestinal, parece estar aumentada nos lactentes que sofrem de cólicas.
Excesso de ar intragastrintestinal – a aerofagia poderia ser causa, mas também pode ser consequência do choro. O uso de antiflatulentos, como a simeticona (frequentemente utilizada na prática), não se mostrou mais eficaz que o placebo, em estudo multicêntrico randomizado, o que fala contra essa hipótese. O excesso de gases também foi atribuído a uma má absorção fisiológica e transitória da lactose, mas as primeiras pesquisas não foram confirmadas.
Tipo de aleitamento – não se verificou diferença significativa entre crianças em aleitamento materno e as que recebem mamadeira, embora um estudo tenha mostrado que o pico da frequência de cólicas era mais precoce nas crianças em aleitamento artificial (duas semanas de vida) do que nas amamentadas (seis semanas de vida).
Na prática pediátrica, os critérios de Wessel podem ser muito úteis para determinar a conduta. Os casos que se enquadram nesses critérios devem receber do pediatra explicação, tranquilizarão e apoio. Os casos que se afastam muito dos critérios devem ser investigados. Choro contínuo nas duas primeiras semanas de vida levantam a suspeita de fome, inclusive por mamadas ineficientes (controlar o peso).
Nos casos associados à regurgitação acentuada e a mamadas nervosas, interrompidas, considerar refluxo gastresofágico, e nas famílias atópicas, em que o lactente apresenta choro acentuado logo após as mamadas, e especialmente se a criança tem outras manifestações alérgicas, pesquisar alergia ao leite de vaca, inclusive nas crianças que mamam leite de peito.
Como toda boa pesquisa, a de Saavedra e cols. dá algumas respostas, como a influência do desmame precoce (embora a cólica vespertina também ocorra na criança amamentada), e levanta muitas dúvidas. Seria interessante comparar os lactentes com cólicas diagnosticadas pelos critérios de Wessel e as crianças chorosas pela percepção da mãe. Quem sabe os autores se animem e aprofundem seu estudo num modo prospectivo e sequencial, fazendo uma pesquisa epidemiológica e etnográfica, com entrevistas em profundidade e observações participantes, uma vez que até hoje nada se tem de muito conclusivo e efetivo sobre o assunto, que venha a dar conforto aos bebês e aos pais aflitos.


Fonte; http://www.scielo.br/pdf/jped/v79n2/v79n2a01

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